Manuel Bandeira
Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho (Recife, 19 de abril de 1886 – Rio de Janeiro, 13 de outubro de 1968) foi um poeta, crítico literário e de arte, professor de literatura e tradutor brasileiro, considerado um dos maiores expoentes da poesia brasileira e uma figura-chave do modernismo no Brasil. Tido como representante da primeira geração do modernismo brasileiro, seu poema "Os Sapos" foi o abre-alas da Semana de Arte Moderna de 1922[1], e o seu livro Libertinagem é considerado uma referência para a poesia moderna brasileira, assim como um marco de divisão entre a primeira e a segunda geração modernista brasileira. Juntamente com escritores como João Cabral de Melo Neto, Gilberto Freyre, Clarice Lispector e Joaquim Cardozo, entre outros, representa o melhor da produção literária do estado de Pernambuco.[2][3] Os temas abordados por Bandeira são amplos e variados. Dentre os temas constantemente presentes, estão o erotismo, o pessimismo e a morte, dentre tantos outros.[4][5] A despeito de ser ateu, temas como a mística cristã aparecem em sua poesia, ao lado de uma poesia voltada ao amor libertino e ao desejo carnal, por exemplo.[6][7][8] VidaFilho do engenheiro Manuel Carneiro de Sousa Bandeira e de sua esposa Francelina Ribeiro de Sousa Bandeira,[9] era neto paterno de Antônio Herculano de Sousa Bandeira, advogado, professor da Faculdade de Direito do Recife e deputado geral na 12ª legislatura. Tendo dois tios reconhecidamente importantes, sendo um, João Carneiro de Sousa Bandeira, que foi advogado, professor de Direito e membro da Academia Brasileira de Letras e o outro, Antônio Herculano de Sousa Bandeira Filho, que era o irmão mais velho de seu pai e foi advogado, procurador da coroa, autor de expressiva obra jurídica e foi também Presidente das Províncias da Paraíba e de Mato Grosso.[10] Seu avô materno era Antônio José da Costa Ribeiro, advogado e político, deputado geral na 17ª legislatura. Costa Ribeiro era o avô citado em "Evocação do Recife". Sua casa na rua da União é referida no poema como "a casa de meu avô".[10] No Rio de Janeiro, para onde viajou com a família, em função da profissão do pai, engenheiro civil do Ministério da Viação, estudou no Colégio Pedro II (Ginásio Nacional, como o chamaram os primeiros republicanos). Foi aluno de Silva Ramos, de José Veríssimo e de João Ribeiro, e teve como condiscípulos Álvaro Ferdinando Sousa da Silveira, Antenor Nascentes, Castro Menezes, Lopes da Costa, Artur Moses. Em 1903, terminou o curso de Humanidades, a família se muda para São Paulo, onde iniciou o curso de arquitetura na Escola Politécnica de São Paulo, que interrompeu por causa da tuberculose (1904).[10] Para se tratar buscou repouso em Campanha, Teresópolis e Petrópolis.[9] Com a ajuda do pai que reuniu todas as economias da família foi para a Suíça, onde esteve no Sanatório de Clavadel, onde permaneceu de junho de 1913 a outubro de 1914, onde teve como colega de sanatório o poeta Paul Eluard.[9] Em virtude do início da Primeira Guerra Mundial, volta ao Brasil.[11] Ao regressar, iniciou na literatura, publicando o livro "A Cinza das Horas", em 1917, numa edição de 200 exemplares, custeada por ele mesmo.[11] Dois anos depois, publica seu segundo livro, "Carnaval".[9] Em 1935, foi nomeado inspetor federal do ensino. Em 1936 foi publicada a "Homenagem a Manuel Bandeira", coletânea de estudos sobre sua obra, assinada por alguns dos maiores críticos da época, alcançando assim a consagração pública.[12] De 1938 a 1943, foi professor de literatura no Colégio Pedro II.[13] Em 1940 foi eleito membro da Academia Brasileira de Letras. Posteriormente, nomeado professor de Literaturas Hispano-Americanas na Faculdade de Filosofia da Universidade do Brasil, cargo do qual se aposentou, em 1956.[14] Manuel Bandeira faleceu no dia 13 de outubro de 1968, com hemorragia gástrica, aos 82 anos de idade, no Rio de Janeiro, e foi sepultado no túmulo 15 do mausoléu da Academia Brasileira de Letras, no Cemitério São João Batista.[15][16] Academia Brasileira de LetrasFoi eleito para a Academia Brasileira de Letras, onde foi o terceiro ocupante da cadeira 24, cujo patrono é Júlio Ribeiro.[11] Sua eleição ocorreu em 29 de agosto de 1940, sucedendo Luís Guimarães Filho, e foi recebido pelo acadêmico Ribeiro Couto em 30 de novembro de 1940.[11] ObraEstiloO estilo de Bandeira é simples e direto, embora não compartilhe da dureza de poetas como João Cabral de Melo Neto, também pernambucano. Aliás, numa comparação entre as obras de Bandeira e João Cabral, vê-se que este, ao contrário daquele, visava a purgar de sua obra o lirismo. Bandeira foi um poeta lírico, embora tenha escrito "Estou farto do lirismo comedido / Do lirismo bem comportado".[17] A temática de sua poesia envolve o cotidiano e o universal, às vezes com uma abordagem de "poema-piada", lidando com formas e inspiração que a tradição acadêmica considerava vulgares. Mesmo assim, conhecedor da Literatura, utilizou-se, em temas cotidianos, de formas colhidas nas tradições clássicas e medievais. Em sua obra de estreia (e de curtíssima tiragem) estão composições poéticas rígidas, sonetos em rimas ricas e métrica perfeita, na mesma linha onde, em seus textos posteriores, encontramos composições como o rondó e trovas. É comum encontrar poemas (como "Poética", do livro Libertinagem) que se transformaram em um manifesto da poesia moderna.[18] No entanto, suas origens estão na poesia parnasiana.[14] Foi convidado a participar da Semana de Arte Moderna de 1922, embora não tenha comparecido, deixou um poema seu (Os Sapos) para ser lido no evento.[19][20] Uma certa melancolia, associada a um sentimento de angústia, permeia sua obra, em que procura uma forma de sentir a alegria de viver. Doente dos pulmões, Bandeira sofria de tuberculose e sabia dos riscos que corria diariamente, e a perspectiva de deixar de existir a qualquer momento é uma constante na sua obra.[21][3] A imagem de bom homem, terno e em parte amistoso que Bandeira aceitou adotar no final de sua vida tende a produzir enganos: sua poesia, longe de ser uma pequena canção terna de melancolia, está inscrita em um drama que conjuga sua história pessoal e o conflito estilístico vivido pelos poetas de sua época. Cinza das Horas apresenta a grande tese: a mágoa, a melancolia, o ressentimento enquadrados pelo estilo mórbido do simbolismo tardio. Carnaval, que virá logo após, abre com o imprevisível: a evocação báquica e, em alguns momentos, satânica do carnaval, mas termina em plena melancolia. Essa hesitação entre o júbilo e a dor articular-se-á nas mais diversas dimensões figurativas. Se em Libertinagem, seu quarto livro, a felicidade aparece em poemas como "Vou-me embora pra Pasárgada", onde é questão a evocação sonhadora de um país imaginário, o pays de cocagne, onde todo desejo, principalmente erótico, é satisfeito, não se trata senão de um alhures intangível, de um locus amenus espiritual.[10] Em Bandeira, o objeto de anseio estará sempre envolto em névoas e fora do alcance. Lançando mão do tropo português da "saudade", poemas como Vou-me embora pra Pasárgada e tantos outros encontram um símile na nostálgica rememoração bandeiriana da infância, da vida de rua, do mundo cotidiano das provincianas cidades brasileiras do início do século. O inapreensível é também o feminino e o erótico. Dividido entre uma idealidade simpática às uniões diáfanas e platônicas e uma carnalidade voluptuosa, Manuel Bandeira é, em muitos de seus poemas, um poeta da culpa. O prazer não se encontra ali na satisfação do desejo, mas na excitação da algolagnia do abandono e da perda. Em Ritmo Dissoluto, seu terceiro livro, o erotismo, tão mórbido nos dois primeiros livros, torna-se anseio maravilhado de dissolução no elemento líquido marítimo, como é o caso de Na Solidão das Noites Úmidas. Esse drama silencioso surpreende mesmo em poemas "ternos", quando inesperadamente encontram-se, como é o caso dos poemas jornalísticos de Libertinagem, comentários mordazes e sorrateiros interrompendo a fluência ingênua de relatos líricos, fazendo revelar todo um universo de sentimentos contraditórios. Em Estrela da Manhã, Lira dos Cinquent'anos e outros livros, as experiências da primeira fase darão lugar ao acomodamento do material lírico em formas mais brandas e às vezes mesmo ao retorno a formas tradicionais. A Cinza das HorasA Cinza das Horas (1917), o primeiro livro do poeta traz 50 poemas, muitos deles são antológicos como, por exemplo, "Desencanto", "Chama e fumo", "Cartas de meu avô", "O inútil luar", "Solau do desamado", "Boda espiritual", "Renúncia". O livro é marcado pela estética parnasiana e simbolista, mesmo que alguns poemas já apontem para renovações como é o caso de "Paisagem Noturna". Muitos dos temas aqui apresentados serão trabalhados pelo poeta nos seus outros livros: a infância, a doença, o cotidiano, a solidão e a morte. CarnavalO segundo livro, Carnaval (1919), já traz poesias que esboçam a saída da atmosfera pesada de melancolia presente em "A Cinza das Horas", mesmo que num ou noutro poema ainda ela ressoe. O livro com 33 poemas traz uma diversidade de técnicas do verso como o uso de rimas toantes (Cf. "Confidência" e "Toante"), malabarismo de rimas (Cf. "A canção das lágrimas de Pierrot" e "Vulgívaga"), os primeiros ensaios de versos livres executados por Bandeira (Cf. "Debussy" e "Sonho de uma terça-feira gorda"), além do poema "Os sapos", sátira direcionada à poética parnasiana. Esse poema é fundamental para abrir caminho para a Semana de Arte Moderna, em 1922. Mesmo assim, o livro ainda traz resquícios das poéticas pré-modernistas, há sonetos, como o belíssimo "O súcubo", rondó e madrigal. O Ritmo DissolutoCom seu terceiro livro, O Ritmo Dissoluto (1924), Manuel Bandeira prossegue no caminho de superação das estéticas pré-modernistas. Em "O Ritmo Dissoluto" há uma presença maior do verso livre, também ganham espaço os tipos, principalmente nas figuras do universo infantil, assim temos poemas como "Meninos carvoeiros", "Rua do sabão" e "Balõezinhos". Essa aproximação com os tipos e referências populares já estavam nos primeiros livros, mas em "O Ritmo Dissoluto" isso revela um movimento por parte do poeta para uma abertura para o mundo. A técnica de Bandeira se torna mais sofisticada, a fatura dos versos chega a sua essência como nos poemas "Noite morta", "Gesso" e "Estrada". O Ritmo Dissoluto é um livro que funciona como rito de passagem para a absorção cada vez maior da estética modernista. LibertinagemPublicado num dos anos mais fecundos da poesia moderna e modernista brasileira, Libertinagem (1930) marca a presença forte da estética modernista: o poema "Poética" é um marco nesse sentido. Além disso, o livro traz poemas marcantes não só para a obra do poeta, mas importantes para a poesia brasileira até hoje. Poemas como "Cacto", "Pneumotórax", "Porquinho-da-Índia", "Evocação do Recife", "Poema tirado de uma notícia de jornal", "Profundamente" e "Vou-me embora pra Pasárgada", para ficar somente nesses, mostram a versatilidade da sua poesia. Em "Pneumotórax" a atitude do poeta frente à doença alcança um outro nível, a ironia é um meio importante para demostrar sua nova postura. "Evocação do Recife" é um canto de amor à sua terra natal como talvez poucas vezes um poeta já escreveu. "Vou-me embora pra Pasárgada" nos mostra o país de delícias, o local mágico em que tudo o que o "mau destino" lhe roubou é possível de acontecer, é o canto da liberdade ao máximo. Tudo isso confirma este livro como um dos mais importantes da poesia brasileira. Em Libertinagem, talvez o mais celebrado dos livros de Bandeira, adotam-se formas modernistas, abandona-se a metrificação tradicional e acolhe-se o verso livre. Em grosso, é um livro menos personalista. Se os grandes temas nostálgicos cedem ao avanço modernista, não é somente porque os sufocam o desfile fulminante de imagens quotidianas e os esquetes celebratórios do modernismo, mas também porque é um princípio motor de sua obra o reencenar a luta dos dois momentos sentimentais da alegria e da tristeza. O cotidiano "brasileiro" aparece ali, realçando o júbilo evocatório, com o pitoresco popular que se assimila, por exemplo em Em "Evocação do Recife", ao tom triste e nostálgico, usa-se o diálogo anedótico para brindar fatos tão sórdidos quanto sua própria doença ("Pneumotórax"); a forma do esquete, favorável à apreensão imediata do objeto, funde-se, em "O Cacto", a um lirismo narrativo que se aperfeiçoará em sua poesia posterior. Tanto em "Libertinagem" como no restante de sua obra, a adoção da linguagem coloquial nem sempre será coroada de êxito. Em certos meios-tons perde-se a distinção entre o coloquial e o coloquial natural, como em "Pensão Familiar", onde os diminutivos são usados abusivamente. Encontra-se colaboração da sua autoria na revista luso-brasileira Atlântico.[22] Lista de obrasPoesias
Prosas
Antologias
Em coautoria
Traduções
Seleção e organização
Sobre o autor
Multimídia
Referências
Ligações externas
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